O Brasil possui uma literatura historicamente ufanista, na qual intelectuais defendiam eloquentemente a identidade nacional e o direito de exercício da cidadania, uma prática de origem grega e adotada quase universalmente. Após revoltas, lutas armadas duramente reprimidas, golpes de Estado, finalmente surge, na década de 1980, uma constituição baseada em direitos humanos festejada por patriotas e elogiada por estrangeiros. No entanto, o brasileiro parece ter-se acomodado com a teoria e esquecido a prática.
O código de leis publicado em 1988 estabeleceu a volta dos três poderes regentes da república outrora banidos pelos militares, e trouxe perspectivas de melhorias tanto para a atuação de cada um desses poderes, quanto para a população, cuja participação no Estado tornou-se mais efetiva. A liberdade de expressão foi uma conquista para aqueles que sofreram períodos ditatoriais e para as futuras gerações habitantes das "terrinhas verdeamarelas". Passada a euforia da conquista, porém, o direito de opinião deixou de ser assiduamente utilizado.
Denúncias de atividades ilícitas e corrupção são diariamente feitas pelos meios de comunicação. O nacionalismo exacerbado, a sede pela defesa do que é do povo e a busca constante por mudanças não se fazem mais presentes no cotidiano do brasileiro. Políticas populistas governamentais, as quais aliviam situações sociais caóticas tais como a fome, por exemplo, abafam tensões e revoltas da maioria populacional, formada por pessoas de baixa renda. De um lado, os conformados com o equivalente a uma cesta básica mensal, do outro, os que reclamam baixinho seja por medo, seja para não incomodar - como se isso fizesse sentido. Assim, a opinião pública acerca dos absurdos praticados por supostos defensores de interesses nacionais torna-se omissa.
A história brasileira revela um passado de conquistas realizadas através de lutas, mortes e bravura; heróis nacionais são aqueles que buscaram justiça. O presente, no entanto, mostra a ética deturpada, a imoralidade do cinismo e do banditismo arrojado como ditadores de um país em que a corrupção generalizada tomou conta de um povo já sem forças para brigar. Está na hora de pôr em prática as leis impostas pela democracia já conquistada e fazer valer o título de "povo heroico" ratificado pelo hino nacional.
sexta-feira, 11 de dezembro de 2009
sábado, 10 de outubro de 2009
Palavras suficientes
Clarice Lispector entrevista Pablo Neruda - recorte de "Entrevistas"
Clarice: O que é angústia?
Neruda: Sou feliz.
Clarice: Escrever melhora a angústia de viver?
Neruda: Sim, naturalmente. Trabalhar em teu ofício, se amas teu ofício, é celestial. Senão é infernal.
Clarice: Quem é Deus?
Neruda: Todos, algumas vezes. Nada, sempre.Clarice: Como é que você descreve um ser humano o mais complexo possível?
Neruda: Político, poético. Físico.
Clarice: Como é uma mulher bonita?
Neruda: Feita de muitas mulheres.
Clarice: Escreva aqui o seu poema predileto, pelo menos predileto neste exato momento.
Neruda: Estou escrevendo. Você pode esperar por mim dez anos?
Clarice: Em você o que precede a criação é a angústia ou um estado de graça?
Neruda: Não conheço bem esses sentimentos. Mas não me creia insensível.
Clarice: Diga alguma coisa que me surpreenda.
Neruda: 748.
Clarice: Que acha da literatura engajada?
Neruda: Toda literatura é engajada.
Clarice: Qual de seus livros você mais gosta?
Neruda: O próximo.
Clarice: A que você atribui o fato de que os seus leitores acham você o 'vulcão da América Latina'?
Neruda: Não sabia disso, talvez eles não conheçam os vulcões.
Clarice: Como se processa em você a criação?
Neruda: Com papel e tinta. Pelo menos essa é a minha receita.
Clarice: A crítica constrói?
Neruda: Para os outros, não para o criador.
Clarice: Você já fez algum poema de encomenda? Se o fez, faça um agora, mesmo que seja um bem curto.
Neruda: Muitos. São os melhores. Este é um poema.
Clarice: Qual é a coisa mais importante do mundo?
Neruda: Tratar de que o mundo seja digno para todas as vidas humanas, não só para algumas.
Clarice: O que é que você mais deseja para você mesmo como indivíduo?
Neruda: Depende da hora do dia.
Clarice: O que é amor? Qualquer tipo de amor.
Neruda: A melhor definição seria: o amor é o amor.
Clarice: Você já sofreu muito por amor?
Neruda: Estou disposto a sofrer mais.
Precisa mais?
L.
Clarice: O que é angústia?
Neruda: Sou feliz.
Clarice: Escrever melhora a angústia de viver?
Neruda: Sim, naturalmente. Trabalhar em teu ofício, se amas teu ofício, é celestial. Senão é infernal.
Clarice: Quem é Deus?
Neruda: Todos, algumas vezes. Nada, sempre.Clarice: Como é que você descreve um ser humano o mais complexo possível?
Neruda: Político, poético. Físico.
Clarice: Como é uma mulher bonita?
Neruda: Feita de muitas mulheres.
Clarice: Escreva aqui o seu poema predileto, pelo menos predileto neste exato momento.
Neruda: Estou escrevendo. Você pode esperar por mim dez anos?
Clarice: Em você o que precede a criação é a angústia ou um estado de graça?
Neruda: Não conheço bem esses sentimentos. Mas não me creia insensível.
Clarice: Diga alguma coisa que me surpreenda.
Neruda: 748.
Clarice: Que acha da literatura engajada?
Neruda: Toda literatura é engajada.
Clarice: Qual de seus livros você mais gosta?
Neruda: O próximo.
Clarice: A que você atribui o fato de que os seus leitores acham você o 'vulcão da América Latina'?
Neruda: Não sabia disso, talvez eles não conheçam os vulcões.
Clarice: Como se processa em você a criação?
Neruda: Com papel e tinta. Pelo menos essa é a minha receita.
Clarice: A crítica constrói?
Neruda: Para os outros, não para o criador.
Clarice: Você já fez algum poema de encomenda? Se o fez, faça um agora, mesmo que seja um bem curto.
Neruda: Muitos. São os melhores. Este é um poema.
Clarice: Qual é a coisa mais importante do mundo?
Neruda: Tratar de que o mundo seja digno para todas as vidas humanas, não só para algumas.
Clarice: O que é que você mais deseja para você mesmo como indivíduo?
Neruda: Depende da hora do dia.
Clarice: O que é amor? Qualquer tipo de amor.
Neruda: A melhor definição seria: o amor é o amor.
Clarice: Você já sofreu muito por amor?
Neruda: Estou disposto a sofrer mais.
Precisa mais?
L.
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