- Tradição, honra, disciplina, excelência - bradou a voz à frente do púlpito desbotado.
E assim seria dali por diante.
Todos os dias aqueles mesmos olhos inexpressivos de outrora multiplicavam-se para verem homens de ternos engomados falarem do mundo, do ontem, do verso...Homens sábios, experientes, luzes do saber. Luzes estas que iluminariam a escuridão das mentes jovens e vazias; que forneceria o brilho necessário para as estrelas do amanhã ascenderem.
"Tradição". De fato o conservadorismo ali existente sustentava o brado do momento primeiro. Tudo mecânico e previsível: repetição, memorização, fixação. O autoritarismo dos homens impõe não respeito, mas tensão, a qual impede qualquer tipo de questionamento, e garante disciplina e excelência.
Erva-daninha. O jardineiro chega para salvar as árvores, cuidar das rosas. Agora sim os olhos brilham, os corações disparam ao encherem-se de esperança: a esperança de sonhar, que chega através da poesia com ou sem rima, com ou sem métrica. A poesia exala um perfume de fragrância ímpar criada ao acaso, sem fórmula. Seu cheiro encanta, inebria, entontece. O jardineiro tem a função de assegurar a beleza e a essência do jardim. Para isso é preciso água, ar, sol, adubo.
Embora as flores necessitem dos cuidados do jardineiro, a autonomia delas faz parte do cultivo. E é o que difere simples homens de uma pessoa da terra: a humildade e sabedoria de entender que é apenas mais uma ferramenta usada pelo botão para produzir seu perfume, moldar sua forma, construir sua vida, determinar o porquê de sua existência.
Desajeitados, os homens arrancarão as rosas já desabrochadas do jardim cultivado pela pessoa da terra. Os espinhos fincarão em seus dedos, deixando cicatrizes após derramar o sangue tão vermelho quanto as pétalas da flor idealizada.
Enfurecidos, os homens dirão que a culpa é do jardineiro. Insistirão com a idéia de que são mais importantes que água, ar, sol, adubo. Persistirão com a vontade de alimentar a erva-daninha. A peste espalhar-se-á.
Medo.
De não ver flores; de não inalar o perfume das rosas; de não enaltecer a beleza do jardim.
Medo nos olhos. Naqueles mesmos olhos inexpressivos de outrora.
Medo.
Medo que ofusca o brilho e apaga a estrela.
Medo!
Os sussurros do jardineiro perdem-se com o vento da noite banhada por um luar sinistro, revelador de miragens.
A peste espalhar-se-á. Algumas rosas murcharão; flores morrerão.
Nem mesmo a mais bela e cheirosa resistirá. Os raios de sol denunciarão os restos caídos na terra. As plantas que resistirem não irão mais se desenvolver; os homens serão água, ar, sol, adubo.
Os mesmos olhos inexpressivos de outrora, os quais principiaram o brilho da estrela do amanhã, olharão para a terra e só enxergarão asfalto. Nada mais.
É que as flores não brotam do concreto.
LC.
3 comentários:
É incrível como a escrita impulsiona a quebra do lado mais sombrio e frio do ser humano.
Se todos lessemos esse texto, passariamos a agir melhor, a viver melhor a plenitude das rosas e partilhar delas seu cheiro, sua forma, não a sendo! Mas,a sentindo!
Sendo por ela, talvez!
Não quero ser uma dessas que fala e põe o homem pra baixo, nas profundezas com seus sentimentos mais profundos ainda.
Mas, quero ser dessas que lutam pra ver um pouco mais que o asfalto - que seja.
Que plantam as sementes, que dá a água - que lhe foi dada -, que partilha o sol - que é de todos -, que dá o adubo pra sustentar!
Temo com o desabrochar das rosas e com a morte das flores.
Mas, temo pouco ao ler palavras tão tocantes.
Palavras que é a erva-daninha que tenta cortar o concreto.
Adivinha?!
Li :D
eahuaehuaehhaeu
Só foi pra brincar.
Bem... É. Laurinha, eu adoro teu jeito de escrever.
Quando eu crescer, quero escrever assim.
aehuehueahuea
Te amo.
Kisses!
Postar um comentário